Keblinger

Blog da Tia Maryane

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

fado tropical


1-Qual a idéia que o texto nos transmite sobre a relação Portugal Brasíl?

2-Qual sua opinião sobre a influência do contato europeu no Brasíl?

3-Leia atentamente o trecho que diz:"Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo ( além da sífilis, é claro).
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar
Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora..

4-Na sua opinião qual o pensamento político do autor?



Composição: Chico Buarque/ Ruy Guerra

Oh, musa do meu fado
Oh, minha mãe gentil
Te deixo consternado
No primeiro abril

Mas não sê tão ingrata
Não esquece quem te amou
E em tua densa mata
Se perdeu e se encontrou
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal

"Sabe, no fundo eu sou um sentimental
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo ( além da sífilis, é claro)
Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar
Meu coração fecha os olhos e sinceramente chora..."

Com avencas na caatinga
Alecrins no canavial
Licores na moringa
Um vinho tropical
E a linda mulata
Com rendas do alentejo
De quem numa bravata
Arrebata um beijo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um imenso Portugal

"Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto
De tal maneira que, depois de feito
Desencontrado, eu mesmo me contesto

Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito
Me assombra a súbita impressão de incesto

Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadora à proa
Mas meu peito se desabotoa
E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa
Pois que senão o coração perdoa"

Guitarras e sanfonas
Jasmins, coqueiros, fontes
Sardinhas, mandioca
Num suave azulejo
E o rio Amazonas
Que corre trás-os-montes
E numa pororoca
Deságua no Tejo
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um império colonial
Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal
Ainda vai tornar-se um império colonial



No contexto original da peça, "Fado tropical" é extremamente irônica, expressando - até com certo deboche - o desejo das elites brasileiras de quererem ser "civilizadas" nos moldes europeus (ou norte-americanos, considerando-se o momento histórico em que a peça foi escrita e apresentada), assim espelhando-se na cultura do colonizador, com o qual não rompem os laços de dependência. Na recontextualização feita por quem produziu o vídeo acima, esse significado histórico é totalmente invertido. Ao colocar imagens que nos remetem a Revolução dos Cravos, golpe que derrubou o governo fascista de Oliveira Salazar em 25 de abril de 1974, o desejo de que o Brasil torne-se, um dia, um "imenso Portugal" perde sua conotação autoritária e repressiva, sua postura subserviente ao colonialismo português (referido ao momento histórico da ação dramática) ou norte-amerticano (referido ao momento histórico da encenação da peça) e passa a ganhar uma conotação utópica e revolucionária de caráter socialista: o desejo de que o Brasil se transforme em um imenso Portugal passa a ser o desejo de que aqui ocorra, um dia, uma revolução similar, de inspiração socialista. A canção que inicialmente denuncia a árbárie da colonização portuguesa passa a ser utópica e a ironia altera-se radicalmente. Em vez do repúdio ao imperialismo português, passamos à admiração do seu momento heróico e revolucionário... Se num primeiro momento mirar-se em Portugal significava subserviência ao imperialismo capitalista e adesão ao autoritarismo local, no segundo momento passa a significar resistência ao autoritarismo local e ao imperialismo capitalista. Que ironia... De modelo de conservadorismo, Portugal passa a modelo de espírito revolucionário. Brilhante releitura!

Fonte: http://outraspalavras.arteblog.com.br/168492/Literatura-e-historia-Fado-tropical-de-Chico-Buarque/